Uma manhã pouco convidativa começava a surgir no horizonte, mais um dia de trabalho e mais um dia em que se tudo corresse bem iria fazer alguém feliz. Tomás olhou para o despertador que marcava 07h00 e lentamente relembrava o porquê de ter de acordar tão cedo. Primeiro que tudo porque achava que aos 26 anos já estava na altura de ser independente, segundo porque no ano anterior tinha sido promovido e com essa promoção um aumento salarial substâncial permitiu-lhe adquirir o seu próprio espaço.
Na altura achou ser uma boa ideia só que rapidamente verificou que a namorada da altura estava mais interessada num recente colega de erasmus e por isso ele em vez de ter uma casa para poder cometer as loucuras que achava ir cometer, passou a ter um espaço para poder acumular mais trabalho que trazia do emprego.
Habitualmente 5 minutos de pensamentos soltos a olhar para o despertador chegavam mas hoje por alguma razão achou que deveria ir um pouco mais além. Enquanto tomava banho olhava para o seu rosto e repetidamente fazia a seguinte pergunta, "Afinal para que te levantas Tomás?".
A questão ficava sempre no ar, tomava o pequeno almoço e saia de casa a caminho do Armazém 14, local onde trabalhava. A empresa "Fast Deliver" tinha a sua sede em três pavilhões nos arredores da cidade, uma empresa que funcionava 24 sobre 24 horas e tinha nos últimos anos aumentado o seu fluxo comercial. O Tomás estava na empresa à cerca de 4 anos, inicialmente como despachante de encomendas mas rapidamente se viu entolado de encomendas que por alguma razão não chegavam ao destinatário. Nas horas mais mortas começou a estruturar um plano para conseguir entregar as encomendas perdidas e rapidamente deu nas vistas ao executar com sucesso este seu objectivo. Ao fim de 3 anos a "Fast Deliver" criou um departamento especifico para as encomendas não reclamadas ou perdidas e ele foi o escolhido para chefia-lo. A noticia saiu nos jornais e a empresa conseguiu muita publicidade à custa desta eficiência do novo Departamento. Para Tomás o trabalho tinha aumentado mas o salário também, isso agradou-lhe e ainda podia chefiar um departamento de duas pessoas. Ele próprio e uma assistente administrativa, a Raquel.
"Porque te levantas de manhã'"............"Para descobrir o rasto às encomendas!"- Era isso mesmo, ele adorava fazer essa pesquisa, talvez até devesse ser detective. Quem sabe um dia não o seria, de momento tudo o que o excitava era a emoção de descobrir o destinatário da encomenda. Era uma sensação que para ele pagava qualquer esforço, quer fosse os bolinhos de natal que estavam perdidos ou então o simples peixe fresco enviado com todo o cuidado à 4 meses atrás e que agora já cheirava muito mal. Graças ao sistema que implementou a taxa de sucesso de devolução ultrapassava os 80%. "Muito bom mesmo"- pensava ele enquanto estacionava o automovel.
Ao contrário do Tomás, a Raquel estava ainda a aprender a gostar do trabalho que fazia. Estava a tentar concluir um curso superior que em teoria lhe daria mais hipoteses de sucesso mas o tempo foi ditando que mais valia arranjar uma ocupação e que os estudos deveriam ficar para segundo ou mesmo terceiro plano. O pai dela era motorista da empresa e quando o novo Departamento abriu ela conseguiu o emprego graças a uma cunha bem metida. O trabalho era leve, requeria apenas método e persistência e o salário não era de deitar fora. Sobre o seu chefe ainda nem tinha bem uma ideia construida. Simpatizava com ele mas achava-o por vezes muito sério, já o esteve para convidar várias vezes para sair mas sempre achou que ele deveria ser do tipo que só vive para o trabalho e nem deve saber divertir-se por isso trabalhavam juntos mas conviviam pouco.
Ela chegava aos escritórios por volta das 8h00 e ao contrário do que poderia supor, ao ver um dia chuvoso que a tornava melancólica, hoje o dia seria tudo menos isso. Á espera dela encontrava-se um pacote e um motorista bem interessante. Se havia coisa que nunca lhe escapava era o fisico de um homem e este era bem constituido - Bom dia, é você que está encarregue deste departamento?- disse o motorista que sorria para ela.
- Sim, quer dizer, trabalho aqui sim. Vem deixar esse pacote?- Enquanto falava abriu a porta e foi buscar as respectivas folhas para se poder dar inicio ao preenchimento da entrada de um novo processo. - Diga-me, há quanto tempo anda esta encomenda no sistema?
O motorista abriu o pacote e retirou de lá umas folhas de papel iguais às que a Raquel tentava preencher - Nós recebemos ordens para fazer já o preenchimento das fichas e por isso já está tudo aqui, verifique apenas para poder ir fazer a minha ronda. - A Raquel não mostrou mas ficou orgulhosa, o Tomás jpa tinha dito que iria fazer cumprir essa norma, mas ela nunca pensou que pudesse ser tão cedo. Mas a prova estava ali, também este motorista era novo e compreendia bem o questionário. Alguns motoristas mais velhos iriam ter dificuldade mas isso não era para ser lembrado agora. Verificou as fichas e estava tudo bem, despediu-se do motorista simpatico e colocou mãos à obra.
O pacote já estava aberto mas o conteúdo do mesmo não, dentro do pacote estava um volúme completamente selado por várias camadas de papel e fita cola. Este momento era sempre uma emoção, neste ponto partilhava do extase do Tomás, nunca se sabia o que as encomendas continham, no fundo ela esperava sempre que se revelasse grandes segredos mas a verdade era bem menos interessante. Esta não seria excepção e por isso cortou as camadas de papel quase mecânicamente e mal viu o que era susteve a respiração. Pela primeira vez achou que deveria ser alguma coisa importante, parecia estupido mas sentia. Por alguma razão aquela encomenda estava a mexer com ela, por debaixo das diversas camadas de papel e fita estava um caderno manuscrito, dentro do mesmo estavam várias folhas soltas o que ainda davam um aspecto mais misterioso. A Raquel não aguentou e abriu o caderno, de imediato uma folha solta caiu e ela soltou um grito, quase como se tivesse cometido algo de mal. Pegou com muito cuidado na folha e começou a ler:
"Querido Ricardo, recebi o teu diário e segui as instruções que me deste. Ele ficou na minha posse o tempo que achaste necessário mas como bem previste ele não pode ficar muito tempo no mesmo sitio sem que rapidamente seja detectado. A teu pedido envio-te de volta e espero que ele não caia em mãos erradas. Toma cuidado contigo e mal o recebas diz-me qualquer coisa, estou muito nervoso sobre este envio, agora que sabem que está aqui comigo receio que ele possa ser desviado. Mas meu bom amigo, confio em ti e se tu achas ser isso o melhor a fazer assim o farei. Cuida de ti."
Acabava de estacionar o carro e já via a Raquel a correr em direcção a ele, "Queres ver que temos crise hoje?!". Abriu a porta do carro e cumprimentou a assistente - Bom dia Raquel, estamos muito energéticos hoje- disse com ar trocista.
- Tomás temos um achado nas nossas mãos, temos de encontrar o dono de um diário. Ele é tarólogo e chama-se Ricardo Sousa. Acho que corre perigo de vida e este diário também é perigoso porque deve conter alguma informação - Ela desbobinou a informação toda que praticamente nem conseguia respirar e foi preciso o Tomás segura-la se não ela iria decerto cair. - Explica-me isso bem....Temos um bruxo e um diário e o que mais?
- Não é bruxo Tomás, temos na nossa posse um diário de um tarólogo e precisamos de o devolver. Isto é importante Tomás - E pegou na mão dele e dirigiram-se para os escritórios.
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